sexta-feira, março 31

Há tempos ofereceram-me uma história para crianças. E é sempre bom ler um conto para crianças de vez em quando! O autor, Ondjaki, conta a história de Ynari, a menina das cinco tranças.

Ynari é uma menina com cinco tranças – diz na contra-capa do livro – e muita vontade de conhecer outra aldeias.
Perto do rio, Ynari encontra um homem pequenino e descobre que a guerra também faz parte do mundo. Com a ajuda das suas cinco tranças a menina vai mostrar que as crianças, com magia e ternura, podem mudar todas as aldeias e acabar com todas as guerras.

A história é muito gira, e tem um pormenor muito, muito engraçado: aquele homem pequenino, que primeiro é mesmo mesmo muito pequenino, aos poucos vai deixando de parecer tão pequeno aos olhos da Ynari!

Lembrei-me desta história porque estava a pensar no que escrever para falar de uma outra amiga que também se viu metida subitamente na aventura do doutoramento! É claro que podia dizer que é sempre muito bom saber que os nossos amigos estão a dar passos grandes na sua valorização pessoal, mesmo que isso seja à custa de muito esforço e algum desgaste… Ou dizer que a amizade é para todos os momentos: para me alegrar quando decidem grandes passos ou quando as coisas correm bem, mas também para os momentos em que tudo parece desmoronar-se e as forças possam começar a faltar!

Mas hoje, com a menina das cinco tranças, queria dizer sobretudo isso: que a amizade é como esse encontro da Ynari com o homem pequenino: a pouco e pouco o amigo vai crescendo em nós… E tu, estás já grande! :-)

quarta-feira, março 29

Quando estava a tentar pôr algumas fotos a acompanhar o texto de ontem deu um erro qualquer e não deixou passar da primeira… Por isso, cá vão mais algumas:


A chegada de barco à ilha da Madalena

A transparência das águas dá para ver diferentes cores no mar...


As ruas estreitas da cidade de Sassari

Basílica da SS. Trindade de Saccargia

terça-feira, março 28

Alghero à noite


A Sardenha é uma ilha grande, muito grande mesmo. Impossível de visitar em pouco mais de um dia, que foi o tempo que passei por lá. Depois de umas trocas de voos à última hora, por estar em obras o aeroporto de Alghero, acabamos por aterrar a cerca de 130 quilómetros, do outro lado da ilha, em Olbia… Mais tempo perdido em viagens, para quem já tinha pouco tempo…

Por isso, na sexta não deu senão para visitar um bocado da noite de Alghero: uma cidade catalã (é verdade, fala-se o catalão por lá…) com ruas estreitas e de aspecto degradado e nada de particularmente muito atraente a nível monumental. Mas não deixa de ser simpática com as suas muralhas, e as praias ao lado. Deserta ainda, parece que enche no Verão, como aliás toda a zona norte por onde andámos.

Sábado, foi para passar pela ilha Madalena e pela Cabrera (a ilha que já foi do Garibaldi). Sem dúvida a zona mais bonita que visitámos, com ilhas por todos os lados, perdidas no Mediterrâneo, e o mar com um aspecto muito limpo: a água, de tão transparente, deixa ver sempre o fundo e, por isso, ganha coloridos diferentes.

Mais umas voltas, sempre à beira mar, até Castelsardo, com a surpresa de poder ouvir os cantos tradicionais sardos para esta época da Quaresma. Um som característico. Cantado só por homens, com umas disonâncias que se tornam agradáveis, e uma voz tremida… enfim, não tenho muitas qualidades para crítico de música, mas aquilo pareceu-me estranhamente belo…

Domingo, tempo para visitar Sassari, uma das maiores cidades da Sardenha, a mais importante do norte da ilha. As mesmas ruas estreitas e o mesmo ar degradado… E acabou-se com um belo almoço (na continuação de uma característica destes dias: comer e beber bem, e em boa companhia!) e, finalmente, uma visita à basílica de Saccargia, uma antiga abadia perdida no meio do nada.

E foi assim que se passou o tempo num instante. Meia hora de avião e está-se de novo em Roma… quem sabe, meia hora de voo e volta-se lá…

segunda-feira, março 27

Um fim-de-semana muito agradável, este pela Sardenha! Pena ter sido pouco tempo… e do tempo, apesar de muito agradável, não dar ainda para um mergulho naquelas águas convidativas da Ilha da Madalena… Fica para uma próxima!

Mas como isto de passear também cansa, fica um bocadito destes dias para amanhã. Hoje deixo apenas parte de um diálogo muito, muito interessante: entre Nicodemos e Jesus (Jo 3, 1-21). Nicodemos é um homem muito actual nas suas dúvidas e nas suas buscas, e com ele podemos também aprender a perguntar o essencial, para descobrir um pouco mais, nas respostas que vai acolhendo.

Esta parte do diálogo tem como imagem principal a do contraste entre luz e trevas. E aparece nesta peregrinação Quaresmal como um convite à alegria de saber que temos, no caminho da nossa vida, alguém que a ilumina: a atitude positiva de Deus, que envia para salvar, espera uma atitude positiva das nossa parte, uma fé alegre e libertadora, que faz da vida um tempo de verdade.

I. E. Repin, Cristo e Nicodemos (1887)

Naquele tempo, disse Jesus a Nicodemos: «Assim como Moisés elevou a serpente no deserto, também o Filho do homem será elevado, para que todo aquele que acredita tenha n’Ele a vida eterna. Deus amou tanto o mundo que entregou o seu Filho Unigénito, para que todo o homem que acredita n’Ele não pereça, mas tenha a vidaeterna. Porque Deus não enviou o Filho ao mundo para condenar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por Ele. Quem acredita n’Ele não é condenado, mas quem não acredita já está condenado, porque não acreditou no nome do Filho Unigénito de Deus. E a causa da condenação é esta: a luz veio ao mundo e os homens amaram mais as trevas do que a luz, porque eram más as suas obras. Todo aquele que pratica más acções odeia a luz e não se aproxima dela, para que as suas obras não sejam denunciadas. Mas quem pratica a verdade aproxima-se da luz, para que as suas obras sejam manifestas, pois são feitas em Deus».


(Jo 3, 14-21)

sexta-feira, março 24

Hoje entreguei os 3 primeiros capítulos da tese ao orientador: 95 páginas. Amanhã começa um fim-de-semana longe de Roma e da tese: Sardenha!

quarta-feira, março 22

No dia mundial da água...


Se a Terra tivesse apenas alguns centímetros de diâmetro, e estivesse a flutuar por cima de um campo qualquer, as pessoas viriam de todo o lado para se maravilharem com ela. Andariam à sua volta, maravilhadas com as suas poças de água, grandes e pequenas, e com a água que corre entre elas. Ficariam admiradas com os montinhos e com os buracos que ela tem e admirariam a fina camada de que a rodeia e a água que fica suspensa nessa camada. As pessoas ficariam maravilhadas com todas as criaturas à superfície da bola e com todas as criaturas na água. Iriam declará-la sagrada, por ser única, e iriam protegê-la para que nada de mal lhe acontecesse. A bola seria a maior maravilha conhecida e as pessoas viriam rezar a ela, pedindo para serem curadas, para atingirem a sabedoria, para conhecerem a beleza e para se perguntarem como era possível tal coisa. As pessoas iriam amá-la e defendê-la com as próprias vidas porque saberiam que, de algum modo, as suas vidas, a sua harmonia, não poderiam existir sem ela. Se a Terra só tivesse alguns centímetros de diâmetro.

Autor desconhecido, em "Enviroteach" 1, 1992
Citado em: Franck Opie, Escuteiro global, um escutismo para a natureza e o ambiente, CNE, 1999, 54.


24. Les fleurs
qui sortent
de terre au
printemps


As flores
que despontam
da terra
na primavera

In:
Marguerite Yourcenar, Os trinta e três nomes de Deus
Edição do Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura
Tradução: Mário Rui de Oliveira

terça-feira, março 21

Há muito que não falo dos estudos. Por isso, eu explico o que ando a fazer neste momento… Pego nos principais elementos pedagógicos do escutismo e faço uma análise de cada deles à luz daquilo que, actualmente, se vai escrevendo sobre pedagogia para a fé (bem… centrando-me naturalmente nos “mestres” da minha Universidade).

Ou seja, a minha convicção é que o escutismo tem uma metodologia a que não é preciso acrescentar nada para ser uma metodologia capaz de potenciar a maturação da fé: o que é importante é que se dê a cada elemento que já possui toda a sua densidade… sem nunca perder de vista a finalidade e objectivos educativos que são assumidos pelo escutismo católico. E nesses elementos está contida toda uma densidade de conhecimentos, de experiência de vida, e mesmo de celebração, que, a seu modo, se tornam um verdadeiro espaço de «estágio» da vida cristã.

Problemas, esses são muitos! Por exemplo, se será possível ou não educar para a fé, já que esta é em primeiro lugar um dom gratuito de Deus… Aqui assumo a posição de que, sem ser possível educar directamente para a fé, é possível fazê-lo indirectamente: criando as condições para que ela surja e amadureça progressivamente.

Mas isto é nível teórico. Porque na prática… bem, na prática há muitas questões: a da liberdade pessoal, de cada escuteiro que pode ou não querer empenhar-se numa resposta à proposta divida, a de cada dirigente que pode ou não ter consciência do seu papel de educador da fé (como educador da integralidade de cada escuteiro), a da verdade com que se vive o seu ser escuteiro, o de perceber de facto o escutismo como um movimento de educação para a fé, o da preparação dos dirigentes, o da aplicação do método… e muitos outros…

E assim vou fazendo uma releitura de todas as principais obras metodológicas que por cá se vão publicando… E, apesar do objectivo neste momento ser muito específico neste contexto do escutismo (por exemplo, hoje entretive-me a ver o que se diz sobre a relação com a natureza como espaço de formação para a fé…) vai servindo também de revisão final para o que vem a seguir…

domingo, março 19

«Um mal-entendido semântico, um erro calculado», é mais ou menos assim que Paul Ricoeur define a metáfora, o único modo que, segundo este filósofo francês, é possível usar para falar da «outra» realidade que está para além «deste» mundo. Por isso, ou se fala poeticamente, violentando as palavras em metáforas, para as fazer dizer o que está para lá do seu significado, ou não se pode falar do mundo de Deus…

O lugar para dizer o Indizível é sempre um desafio à imaginação… à capacidade poética. Percorrendo a linguagem religiosa, de qualquer religião, deparamo-nos com um mundo de sinais, símbolos, mitos, ritos… formas de procurar dizer aquilo que parece ser reservado ao espaço do silêncio.

No entanto… temos também uma história para contar! Deus não fica fora da história. Faz-se história. Num tempo. Num lugar. História contada e recontada ao longo dos séculos, chega hoje a nós.

História e metáfora envolvem-se em nós: e podemos sentir as chicotadas que abanam as bancas que fazem do nosso templo uma confusão onde resta pouco espaço para o essencial. E nos tornam insensíveis para pressentir os sinais, que continuamos a pedir como prova de uma presença, quando Ele mora em nós. Ou quando encarceramos Deus em templos de pedra, quando Ele quer correr no bater do coração…

História e metáfora, como a que Jesus narra: um templo, onde derruba as bancas para dar lugar ao ressurgir do encontro com o Pai; outro templo, o seu corpo, destruído pelos homens mas levantado por Deus, na ressurreição.


El Greco, Jesus Cristo expulsa os comerciantes do templo
(National Gallery, Londres)


Estava próxima a Páscoa dos judeus e Jesus subiu a Jerusalém. Encontrou no templo os vendedores de bois, de ovelhas e de pombas e os cambistas sentados às bancas. Fez então um chicote de cordas e expulsou-os a todos do templo, com as ovelhas e os bois; deitou por terra o dinheiro dos cambistas e derrubou-lhes as mesas; e disse aos que vendiam pombas: «Tirai tudo isto daqui; não façais da casa de meu Pai casa de comércio». Os discípulos recordaram-se do que estava escrito: «Devora-me o zelo pela tua casa».
Então os judeus tomaram a palavra e perguntaram-Lhe: «Que sinal nos dás de que podes proceder deste modo?».
Jesus respondeu-lhes: «Destruí este templo e em três dias o levantarei».
Disseram os judeus: «Foram precisos quarenta e seis anos para se construir este templo e Tu vais levantá-lo em três dias?».
Jesus, porém, falava do templo do seu corpo. Por isso, quando Ele ressuscitou dos mortos, os discípulos lembraram-se do que tinha dito e acreditaram na Escritura e na palavra de Jesus. Enquanto Jesus permaneceu em Jerusalém pela festa da Páscoa, muitos, ao verem os milagres que fazia, acreditaram no seu nome. Mas Jesus não se fiava deles, porque os conhecia a todos e não precisava de que Lhe dessem informações sobre ninguém: Ele bem sabia o que há no homem.

(Jo 2, 13-25)

sexta-feira, março 17

Artur Bual


É com pena que não posso aceder ao convite (obrigado Mário!) para a inauguração da exposição «Cristo(s) e a transcendência» - pintura e desenho de Artur Bual, que ocorre este Domingo 19 de Março, no Mosteiro de São Martinho de Tibães.

Como vai estar patente até 5 de Maio, pode ser que a informação ainda possa servir a alguém que queira fazer uma viagem agradável pelos itinerários da história e da arte…

Num Mosteiro fundado pelos finais do século X, um artista contemporâneo, recentemente falecido, que é considerado um pioneiro da pintura gestual em Portugal, de quem alguém escreveu: «Pela profundidade humana e verdade intrínseca que exprime, a sua pintura não nos deixa indiferentes, antes nos torna cúmplices do drama em que se envolve, através da problemática estética que suscita».

quinta-feira, março 16

Taizè, Páscoa de 2004


Pois, mandaram-me esta foto de quando estive por Taizè na Páscoa de 2004… E como hoje recebi um mail do Secretariado da Juventude de Leiria a dizer que tinham 13 vagas por preencher nos autocarros, na peregrinação deste ano a Taizè, lembrei-me de a publicar por cá em homenagem ao gorro que a minha irmã gentilmente me emprestou para esse tempo!

Entretanto, se alguém se quiser inscrever, pode passar pelo site do Secretariado, que devem estar por lá os contactos, algures… Eu já tratei da minha inscrição!

terça-feira, março 14

Às vezes surgem oportunidades na vida com as quais nem sonhávamos… ou melhor, até podiam estar nos horizontes de um futuro algo longínquo… e, de repente, têm de ser decididos agora!!! A urgência, que dá pouco tempo para optar e medir entre prós e contras, pode ser uma ajuda para se decidir sem calculismos de riscos que muitas vezes não passam de fantasmas dos nossos medos… Isto para dizer que é com muita simpatia que sei, de um dia para o outro, que uma amiga, quase sem o querer, se vai lançar na aventura de um doutoramento! Medo de estudar por já ter passado algum tempo desde que se tinham deixado os bancos da escola, ou uma certa percepção de incapacidades ou dificuldades linguísticas? Nada disso é maior que a sede de saber e de crescer… Força aí!

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Ainda a dar os primeiros passos, mas já on-line, mais um blog de um padre: o Carlos Almeida, de Castelo Branco. Como começa por me fazer um agradecimento público, não posso deixar de divulgar… :-)

segunda-feira, março 13

O sol com que nasceu o dia de hoje não me permitiu ficar à tarde em casa… Depois do teatro de ontem, tão intensamente revelador da depressão do isolamento (grande desculpa…) ajudou a saborear ainda melhor o espaço aberto dos «Casteli Romani», uma zona de montanha relativamente perto de Roma. Passei por Grottaferrata, e voltei a visitar a abadia de São Nilo. Depois, pela primeira vez, fui até Rocca di Papa, mesmo no alto do monte, donde dá para apreciar todo o vale onde se estende Roma, ver o mar ao fundo, e ainda uma vista sobranceira sobre todo o lago de Albano.

O cimo do monte é sempre um lugar privilegiado. Vê-se mais longe… Um pouco como acontece no Evangelho de hoje. Lá em cima, os discípulos puderam ver mais longe, perceber um pouco melhor o objectivo de todo o caminho que tinham para fazer até à cidade de Jerusalém. Puderam entrar um pouco mais na vida de Deus, e ficaram tão fascinados que já queriam mesmo eram montar umas tendas para ficar por lá… Mas há um caminho a fazer e é preciso descer de novo à planície da vida…

Para mim, este sempre foi um texto muito significativo, no sentido do equilíbrio que é importante manter na vida. Ou seja, às vezes é preciso «subir à montanha» para depois «descer» de novo e continuar o caminho com a certeza do objectivo que se persegue. No equilíbrio de não querer estar sempre «lá em cima», mas também de não passar sem ousar o encontro que «lá» se estabelece.

A vida tem necessariamente a marca da cruz. Lembra-nos a Quaresma. Para a viver não apenas como um peso de sofrimento ou de dor, mas sobretudo como aquilo que é (a cruz é sobretudo o pegar na vida com garras de amar, na esperança, sem medo de se perder na entrega), às vezes, lembra-nos também a Quaresma (e logo no início), há que reencontrar o espaço da partilha da vida de Deus.

Este é também o espaço da verdade de nós mesmos. De passarmos para além do imediato, de olharmos além do sentimento do momento, de refundamentarmos as opções que marcam a existência e de lhes dar uma textura divida… Não para apagar a «cruz» em que é preciso agarrar, mas para a saber já marcada pela força da ressurreição.


Raffaello Sanzio (em colaboração com Giulio Romano), Transfiguração. 1518-20.
Óleo com 405 cm por 270 cm. Museus do Vaticano, Roma.
Reprodução em mosaico na basílica de São Pedro.




Naquele tempo, Jesus tomou consigo Pedro, Tiago e João e subiu só com eles para um lugar retirado num alto monte e transfigurou-Se diante deles. As suas vestes tornaram-se resplandecentes, de tal brancura que nenhum lavadeiro sobre a terra as poderia assim branquear. Apareceram-lhes Moisés e Elias, conversando com Jesus. Pedro tomou a palavra e disse a Jesus: «Mestre, como é bom estarmos aqui! Façamos três tendas: uma para Ti, outra para Moisés, outra para Elias». Não sabia o que dizia, pois estavam atemorizados. Veio então uma nuvem que os cobriu com a sua sombra e da nuvem fez-se ouvir uma voz: «Este é o meu Filho muito amado: escutai-O». De repente, olhando em redor, não viram mais ninguém, a não ser Jesus, sozinho com eles. Ao descerem do monte, Jesus ordenou-lhes que não contassem a ninguém o que tinham visto, enquanto o Filho do homem não ressuscitasse dos mortos. Eles guardaram a recomendação, mas perguntavam entre si o que seria ressuscitar dos mortos.

(Mc 9, 2-10)



domingo, março 12


Praga, «passeio dourado», se não me engano. É lá em cima, no castelo de Praga. Estive lá no Verão passado quando fazia um interrail depois das Jornadas Mundiais da Juventude.

Praga é de facto uma cidade encantadora, tipo terra encantada, ou contos de fadas… Mas lembro agora Praga porque foi nesse tal bairro do seu castelo que Kafka escreveu algumas das suas obras. O que li dele foi coisa pouca: o Processo e Metamorfose.



Mas hoje fui ao teatro para ver a Metamorfose em palco. Ia curioso para ver como se saía aquela coisa de uma personagem que aos poucos vai passando de pessoa a insecto (o livro tem algumas coisas verdadeiramente aterradoras…). Mas saiu-se muito bem! Uma coreografia muito bem feita, por uma companhia espanhola, La fura dels baus (é verdade, fui ver um teatro em espanhol no centro de Roma…) que, para além de procurar ser fiel ao texto de Kafka, não deixou de o «actualizar» de alguma maneira, tratando a metamorfose física (do texto kafkiano) sobretudo numa metamorfose psicológica, com a história de um homem que o deixa de ser pelo isolamento que, para além de ser exterior (ele fecha-se no seu quarto e não fala com ninguém, nem mesmo com a família), é sobretudo interior…

quinta-feira, março 9

Será que isto de me fartar de telejornais que passam 45 minutos a tratar da mesma notícia é anormal? Francamente, às vezes não sei se estou a ver as notícias ou uma telenovela…

quarta-feira, março 8

Fui ver os arquivos do ano passado para este dia 8 de Março, e encontrei isto:

Porque hoje é o «Dia Internacional da Mulher», mas sobretudo porque o mundo não tinha nenhuma graça sem elas, um beijito especial a todas as que já tive a sorte de conhecer! E certamente que este dia «delas» não quer dizer que os outros sejam todos «deles»… ou será?! ;-) Fora de brincadeiras… Certamente que sabem como surgiu este dia! Para quem não sabe, aqui fica uma pequena nota que encontrei no Diário de Notícias de hoje:


No dia 8 de Março de 1857, as operárias têxteis de uma fábrica de Nova Iorque entraram em greve, ocupando a fábrica, para reivindicarem a redução de um horário de mais de 16 horas por dia para 10 horas. Estas operárias que, nas suas 16 horas, recebiam menos de um terço do salário dos homens, foram fechadas na fábrica onde, entretanto, se declarara um incêndio, e cerca de 130 mulheres morreram queimadas.
Em 1910, numa conferência internacional de mulheres realizada na Dinamarca, foi decidido, em homenagem àquelas mulheres, comemorar o 8 de Março como "Dia Internacional da Mulher". De então para cá o movimento a favor da emancipação da mulher tem tomado forma, tanto em Portugal como no resto do mundo.

terça-feira, março 7

Finalmente, hoje consegui terminar a primeira versão do 2º capítulo (sujeita a revisões, é claro, mas já está!). E com isto já estão escritas 65 páginas. Talvez demasiadas, mas depois é mais fácil cortar, caso seja necessário. Esta semana quero, além de avançar já para o 3º capítulo, entregar estes dois ao orientador para ver o que ele diz…

segunda-feira, março 6

Simples e conciso. Ao estilo de Marcos. Mas está lá tudo…
- o Espírito que impele Jesus ao deserto, o mesmo Espírito que 2 versículos antes tinha descido sobre Ele em forma de pomba, no baptismo, e que, junto com a voz paterna «Tu és o meu Filho amado», confirmam a identidade de Jesus;
- o deserto, com toda a sua densidade de lugar de encontro com Deus e de confirmação de uma aliança entre Deus e a Humanidade que, no número 40 ganha a força de ser experimentado em toda a sua densidade; o deserto que é o lugar para onde Deus quer conduzir o seu povo para, como a uma esposa, a seduzir e lhe falar ao coração (cf. Oseias 2, 16);
- Satanás, o tentador, que não está presente apenas num momento concreto, mas no prolongar da vida que se vive no deserto, como este caminho de provação a caminho da Terra Prometida;
- os animais selvagens, com quem vivia Jesus, sinal de um tempo novo, a Nova Aliança, o tempo messiânico prometido onde o menino pode meter a mão na cova da víbora (cf. Isaías 9, 11), um restabelecer do paraíso na figura de um novo Adão (Jesus);
- os Anjos, que serviam Jesus, sinal da presença de Deus, essa presença intensa daqueles que, por definição, são os mensageiros divinos, que trazem a novidade constante de Deus, e que servem Jesus nessa relação de intimidade com o Pai, para que «não tropece em alguma pedra», e ultrapasse todos os perigos (cf. Salmo 91, 11-13).

Se tivermos em conta que a grande pergunta que preside a todo o Evangelho de Marcos é a da identidade de Jesus («Quem dizem os homens que Eu sou? (…) E vós, quem dizeis que Eu sou?», Mc 8, 27.29), este texto, quase inaugural, depois do Baptismo, é uma confirmação desta identidade afirmada anteriormente: «Tu és o meu Filho amado». Todos os sinais presentes falam de algo de novo que, em Jesus, vai começar, e que envolve toda a humanidade que (como recordam as outras leituras deste 1º Domingo da Quaresma), pelo Baptismo, se fazem participantes desta novidade divina: «Esta água é figura do Baptismo que agora vos salva, que não é uma purificação da imundície corporal, mas o compromisso para com Deus de uma boa consciência» (1 Pedro 3, 21).

Diante desta identidade de Jesus, que se começa a desvendar, logo no início do Evangelho de Marcos, e também no início da Quaresma, somos imediatamente confrontados pelo Filho de Deus que quer iniciar um tempo novo (o tempo do «Reino» de que se foi falando por aqui…) connosco. Marcos como que nos mete logo de princípio «entre a espada e a parede»: se sabes quem é este Jesus não podes ficar indiferente a Ele! «Arrependei-vos e acreditai no Evangelho»…


Moretto da Brescia, Cristo no deserto, (aprox. 1450), New York


Naquele tempo, o Espírito Santo impeliu Jesus para o deserto. Jesus esteve no deserto quarenta dias e era tentado por Satanás. Vivia com os animais selvagens e os Anjos serviam-n’O.
Depois de João ter sido preso, Jesus partiu para a Galileia e começou a pregar o Evangelho, dizendo: «Cumpriu-se o tempo e está próximo o reino de Deus. Arrependei-vos e acreditai no Evangelho».


(Mc 1, 12-15)

sábado, março 4

Companheiro de muitas viagens, confidente de muitas conversas, colega de muitas saídas, parceiro de muitas cadeiras, o Paulo deixou Roma antes de mim… No futuro, é bem provável que nos cruzemos em muitos projectos.

Deixou-me há uns tempos um texto, para que o publicasse aqui:

A minha Mãe
Quando ela acabou, foi colocada na terra
Flores nascem, borboletas esvoejam por cima...
Ela, leve, não faz pressão sobre a terra
Quanta dor foi preciso para que ficasse tão leve!

Bertolt Brecht

quinta-feira, março 2

Um «tempo privilegiado da peregrinação interior até Àquele que é a fonte da misericórdia», assim diz o Papa na mensagem para a Quaresma deste ano.

A imagem da peregrinação para falar da vida é sempre oportuna… Faz sempre bem lembrar que estamos a caminho, que esta não é a nossa «pátria definitiva» (como recordam as cinzas do princípio da Quaresma…), mas que o caminho se faz com o sentido de se saber com um destino preciso: essa «fonte da misericórdia» que é a «casa do Pai».

Não é preciso ser muito prático em questões de peregrinações para se saber que, quando se faz uma a pé, se leva apenas o essencial…

Quaresma é um tempo oportuno para, neste sentido, peregrinarmos à essencialidade de nós próprios, como recordam os 3 «sinais» do Evangelho de quarta-feira de cinzas (que é como que o texto programático para todo o tempo), que falam da essencialidade da pessoa enquanto relação:
- consigo próprio: o jejum que é senão essa peregrinação interior ao essencial de nós mesmos para sabermos quem somos, mais do que o que temos, e do que nos podemos «privar» ou purificar para sermos mais nós próprios…?
- com os outros: a esmola, temos a nossa vida para partilhar, não o que nos sobra, mas sobretudo no que somos…
- com Deus: a oração, porque é n’Ele que está a fonte da Vida, donde vimos e para onde vamos, que enche de sentido cada momento do caminho.

Em tudo, a certeza de que é um tempo de preparação para a Páscoa: no horizonte está sempre a Vida.

Vicent van Gogh, Os primeiros passos


Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: «Tende cuidado em não praticar as vossas boas obras diante dos homens, para serdes vistos por eles. Aliás, não tereis nenhuma recompensa do vosso Pai que está nos Céus. Assim, quando deres esmola, não toques a trombeta diante de ti, como fazem os hipócritas, nas sinagogas e nas ruas, para serem louvados pelos homens. Em verdade vos digo: já receberam a sua recompensa. Quando deres esmola, não saiba a tua mão esquerda o que faz a direita, para que a tua esmola fique em segredo; e teu Pai, que vê o que está oculto, te dará a recompensa. Quando rezardes, não sejais como os hipócritas, porque eles gostam de orar de pé, nas sinagogas e nas esquinas das ruas, para serem vistos pelos homens. Em verdade vos digo: já receberam a sua recompensa. Tu, porém, quando rezares, entra no teu quarto, fecha a porta e ora a teu Pai em segredo; e teu Pai, que vê o que está oculto, te dará a ecompensa. Quando jejuardes, não tomeis um ar sombrio, como os hipócritas, que desfiguram o rosto, para mostrarem aos homens que jejuam. Em verdade vos digo: já receberam a sua recompensa. Tu, porém, quando jejuares, perfuma a cabeça e lava o rosto, para que os homens não percebam que jejuas, mas apenas o teu Pai, que está presente em segredo; e teu Pai, que vê o que está oculto, te dará a recompensa».


(Mt 6, 1-6.16-18)


quarta-feira, março 1

Concluindo toda uma série de «postas» sobre o tema do «Reino de Deus», neste dia de Carnaval que por aqui é um dia como os outros (a diferença foi ter mais um amigo coreano a fazer a defesa do doutoramento, e consequentemente ter um jantar coreano com direito a peixe cru e tudo…), vou continuar a apresentar a síntese de um meu professor, Luis Gallo de seu nome.

Depois da análise da acção de Jesus, ele conclui que «o reino de Deus é para ele o estabelecer pleno e estável da soberania de Deus no mundo, ou então o mundo plenamente coincidente com a vontade original de Deus, ou ainda, de forma mais concreta, a vitória plena e definitiva de Deus sobre todas as espécies de mal existentes no mundo».

Trata-se de uma realidade que:
- diz respeito a Deus, mas também aos homens e mulheres concretos: é o estabelecer da soberania de Deus em benefício de todo o ser humano, sem excepção; é de Deus para os homens;
- é um dom, mas também compromisso: oferecido para o construirmos;
- escatológico, no sentido que será plenamente realizado no futuro pleno e definitivo de Deus, mas também presente e actual, no aqui e agora da nossa história;
- é espiritual mas também corporal: diz respeito à totalidade da pessoa humana;
- é individual, mas também social: tem a ver com cada pessoa individualmente falando, mas enquanto membro da humanidade;
- diz respeito aos indivíduos e à relação entre eles, mas também às estruturas onde se realizam essas relações;
- é universal, para todos, mas também destinado em primeiro lugar e de modo preferencial para os últimos, aqueles a que mais necessitam de vida.

Andrei Rublev, Cristo Salvador (ícone)


São João resume numa frase toda esta realidade: «Eu vim para que tenham vida, e a tenham em abundância» (Jo 10, 10). O «Reino de Deus» é a «Vida em abundância»…

Não admira portanto, que seja este «o» projecto de Jesus. Tudo o que faz, tudo o que diz, é no sentido de estabelecer esta «soberania» de Deus. «O Reino dos Céus é semelhante a um tesouro escondido no campo; um homem o acha e torna a esconder e, na sua alegria, vai, vende tudo o que possui e compra aquele campo» (Mt 13, 44). Ele encontro esse «tesouro»…